Beatriz Costa deu voz a uma das tarefas mais delicadas, por um lado, e mais desgastantes, por outro: lavar a roupa de uma família. Roupa pessoal e roupa de casa.
Recorrendo aos rios e a toda a espécie de água corrente, usando o sabão, ou outra mistura adequada à sujidade de cada peça, o resultado, além de agradar a quem usasse tais vestes, agasalhos ou componentes de decoração, seria a forma mais verdadeira de provar a competência de quem tinha como tarefa tal fado.
Muitas foram as experiências de Física e Química para que a actividade de lavadeira fosse facilitada e o resultado cada vez mais satisfatório, de preferência, a olhos vistos.
A dinâmica das famílias foi evoluindo até aos dias de hoje em que a mecanização facilitou em muito tão árdua tarefa, sobretudo no que diz respeito à limpeza de peças de grandes dimensões. O acesso à lavagem das diferentes peças também foi facilitado com os inúmeros profissionais especialistas a quem podemos recorrer e até locais em que qualquer cidadão pode tratar da roupa individualmente.
A publicidade foi ganhando terreno sob a égide do audiovisual. O sabão perfumado, de marselha, chegou-nos com a etiqueta de “Clarim”, incitando à lavagem a toque de marcha militar.
Posteriormente, o sabão em pó, de fácil dissolução na água, viria revolucionar parte dos cuidados com a lavagem da roupa.
Na década de 60, do século passado, longe do conceito de formação contínua, algumas senhoras tiveram como emprego ensinar a utilizar um novo produto. Agendavam a sessão com as donas de casa que estariam disponíveis para as receberem, de preferência várias, na mesma rua ou bairro. No dia e hora marcados, uma carrinha tipo “pão de forma” trazia um grupo de “fadas madrinhas” da manutenção de qualquer enxoval.
A minha mãe, sempre atenta a (algumas) inovações, também aderiu à experiência.
Assisti à demonstração. Curiosa, por natureza, tendo por “vingança” a observação atenta face ao aviso “ver, ouvir e calar”. A do “calar” devia-se à minha inata vontade de opinar, quase sempre de forma inconveniente. E, naqueles tempos, todo o cuidado era pouco…
A representante da marca “lava mais branco” (na concorrência, o detergente era “o mais poderoso”), OMO, para quem se lembra, despejou uma quantidade generosa de grânulos azuis, dissolveu-os bem num tanque cheio de água limpa. A espuma imensa ia acrescentando à preparação algo de mágico.
Peça por peça, a roupa branca foi entrando. Tudo aconchegado e pouco mais que uma leve agitação da água, teve início um período de repouso. O detergente iria actuar por si.
O intervalo levou a um a conversa amena, sendo sublinhado o tempo ganho e sem despender esforço.
Terminado esse período, cada peça foi retirada e torcida. Despejado o tanque e cheio novamente, procedeu-se ao enxaguar.
A roupa brilhava, como nos anúncios de imagem, e o perfume deixado ficaria na memória olfactiva até o cérebro a descartar.
Foi uma tarde agradável, de aquisição de conhecimentos, graças à inovação no mercado, e, sobretudo, de revisão em questões aritméticas: custo de um pacote de detergente que daria, com muito boa vontade, para duas lavagens no tanque…
Já nessa altura existia à venda um outro detergente em pó azul, só que em doses mais reduzidas, sem qualquer título e em saco de plástico transparente (o antepassado do produto de marca branca?). conheci-o quando, um dia, ao fazer um recado à minha avó, na aldeia, na loja que tudo vendia, uma figura baixinha, envolta num lenço que lhe abafava a voz, pediu, em tom lento:
- Ó menina Maria, queria um pacotinho d’omem, se fachavor!
